7/31/2006
Quem não nos conhecesse em quem mais pensaria, ao entrar pela porta que deixaste aberta
como quem convida, numa obscena oferta: entrem e venham ver!?
Mas entrei eu. É tarde para saber se era a mim que esperavas.
É tarde para saber seja o que for, até o que senti: repugnância ou dor?
Ah como eu queria deitar fora o odor que saía dos dois corpos suados!
Como eu gostava hoje de seguir-te o rasto cheio de estrelas
Mas não consigo vê-las de olhos consporcados.
E foste tu quem os cegou de vez para as coisas belas.
Hoje caminho pelos caminhos escuros sem quaisquer ilusões.
Desdenho do brilho do sol nos lençóis de água
E bebo o ácido vinho das tabernas, não para me embebedar
para esquecer apenas, o contorno irreal das tuas pernas.
7/29/2006
Fim?
Caminhava sozinho a habituar-me. Queria costumes que não te envolvessem.
Fins são fins!
Não gosto de retornos. O recomeço é enquinado de passado.
Mas tu passas por mim e sigo-te sem querer ...
Que hábito o teu: deixar astros no rasto!
7/27/2006
Meu mar
7/25/2006
Aurora
7/24/2006
Espera
aprendi tarde.
só depois de perder-te e ficar horas que me parecem anos,
gato vadio que sou e que fui sempre.
é inverno cá fora, dentro a mim
abre escuta! nada do que possas fazer me fará pior
do que este ignorares a própria dor
7/23/2006
nasci no Inverno
aprendi a andar já com flores nos caminhos
mas há tanto caminho por andar e eu quero morrer no Outono.
com cores mansas a aplanar-me a velhice dos passos
tanto me faz dormir em vãos de escada como em casa de amigos
eu só deito o corpo, nunca durmo
e sou maníaco, trágico, taciturno
e ainda por cima sei isso tudo e não me importo nada!
pior és tu, que voltas sempre que fecho os olhos
abrir dentro dos meus os teus, na calada forma de estar
que és dentro de mim. e eu beijo esse olhar que amei e sei.
que é que me importa a morte? quero é essa cor de olhos na calçada
e também quero morrer de madrugada.
Fallengelna
7/20/2006
razões: duas, ou três?
já atirado ao chão, por ele caminhei
arrastando os pés no empedrado.
constou-me depois que ambas choraram
cada uma em seu canto e certamente, por um homem diferente do que sou.
eu nutro uma profunda gratidão pelas duas:
hoje são meus os campos e as noites caladas, as ruas e as luas.
São lágrimas, Senhor.
é preciso partir para que nos chorem.
eu precisei partir para viver.
tu fizeste magias negras brancas
choraste e ofereceste lágrimas para eu beber.
não fiquei, não podia, meu amor!
não conheces o monstro que hoje sou, todo feito de dor.
não posso amar. não sei não quero mesmo.
fui adorado tive paixões a resmo
no fim sobrou vazio e um travo a vinho azedo.
amores são sentimentos sãos, para gente sã
eu já enlouqueci de amor há tempo a mais
posso chamar-te amiga ou minha irmã
posso chamar-te flor ou pedra de calçada
lágrima de romã e chuva abençoada
mas tive de partir e ficaste para trás.
nem sonhas o conforto que me dás na caminhada!
ah, mas livre como vou agora ao sol e ao vento
não atires ao eco o teu lamento.
o meu caminho não tem princípio ou fim
tem de ter paz.
7/19/2006
manhã
banho tomado acaricias a chávena de café e não a mim
entendo. eu não vim para ficar. não faço parte
dessa rotina suave que te emoldura a dourado, na manhã.
o livro amarelou mas não te importas. um livro não tem tempo.
pena pouco ter escutado do que disseste à noite!
tarde para lamentar. parei na tua casa conhecida
afinal até eu tenho de dormir em algum lugar...
na entrega sem esforço reabriste uma ferida
minha. tu lês tão indiferente que me sinto já longe
mandaste-me de novo para o passado
razão tens tu. sou vagabundo e tu inteligente
que pegue na mochila e toca a andar.
estou de partida e nem sequer me olhas
faço ruídos vários, bato portas. tu lês, tu nem te importas...
saio. o sol arde nos olhos mas sou livre.
pardal esvoaçante sem um rumo certo.
que terá ela dito? soava a interessante
mas era outra a fome que eu trazia...
e sigo, assobiando, no anúncio do dia.
7/18/2006
o gato-eu
O gato é meu irmão. Ama e odeia tal como os de parentesco. Invade territórios, tudo é seu.
Sei sempre que o meu gato não é meu. Não me deixa esquecer, na sua liberdade natural, dá um salto e muda rapidamente de forma de estar e ser.
Assim deveria eu proceder, parece querer lembrar-me.
Olhar atento e frio. Nada de especiais apegos, que aquilo que hoje é verdade, é a grande mentira de amanhã se se fala de afectos.
E no entanto, ninguém mais do que os gatos solta no espaço filhos netos e bisnetos.
Nenhuma problema em procriar. Morrem muito de fome ou maus tratos, quando aprisionados e se libertos, em baixo a automóveis indiferentes ao som do esmagamento ou entre dentes de cães, pela trela de gente.
Os gatos sabem isso e procriam! que a espécie tem de continuar.
Sorrio face à nossa preguiça, somos muitos para quê ter medo de acabar?
Acabaremos no meio de uma dessas bombas ainda por inventar(?). Morreremos às nossas próprias mãos.
Eu não. Eu tenho um gato a imitar: faço uma mala com alguns pertences (coisas de gentes que é que se há-de fazer?) e deixo a porta aberta . Ficam-me para trás filhos e outros parentes.
Que alinhe na guerra quem quiser. Que eu, faça ele chuva ou sol, vou no sentido oposto.
Hei-de morrer é claro mas, nunca por nunca ser, eu morrerei por gosto.
7/17/2006
para ti, flor em amarelo.
uma rosa para uma mulher
ao meu jeito ao meu gosto de ser
assim sem mais
sem nenhuma razão
que não seja o desejo de lha dar todos os dias
transformando este verão em primavera
amena para a sua pele e os seus cabelos
numa ternura comovente em mim
ou pela vontade só de vê-la assim.
pobres judeus
predadores de nós
em amarelo a natureza é predadora
na mesma folha caçam presa e caçador
presa e presa, na pressa de viver
nós vivemos na pressa de matar
para sermos maiores e mais ricos
poderosos sobre povos pobres e menores
há comportamento mais irracional
que o do ser racional que se diz homem?
neste espaço a amarelo e preto
verei o meu e o alheio dia a dia
sem arte engenho ou qualquer fantasia.
assim, a duas cores todo ele feito.